segunda-feira, 6 de junho de 2016

E VOCÊ , TEM VONTADE DE CONSTITUIÇÃO¿

            Desde a minha adolescência, quando comecei a tomar consciência da importância da política no mundo e comecei a militar, sempre achei que a educação é transformadora e a saída para um mundo melhor.
            A minha infância e adolescência foi no final da ditadura, já não era tão perigoso questionar e buscar certos conhecimentos, mas mesmo assim a escola ainda tinha muitos resquícios da ditadura, todas as quartas-feiras tínhamos que cantar o hino nacional enfileirados na quadra, e tinhamos matérias como EMC (Educação Moral e Cívica) e OSPB (Organização Social e Política Brasileira). A primeira ainda na infância, era bem centrada nos deveres de cidadão, óbvio que dentro do sistema de opressão que vivíamos (anos 1970), já a segunda (anos 1980) foi um pouco mais leve, e tivemos a sorte de ter um professor que puxava no que era possível para a justiça social, e foi aí que eu comecei a querer fazer parte de algo mais que ultrapassasse os muros da escola.
            Mas a vida não é fácil assim, questionar e querer um modelo diferente de educação e de conhecimento extra muro na educação convencional não era fácil, as famílias conservadoras e ainda com muitos medos que a ditadura trazia, não queria permitir algumas rebeldias.


            Passaram-se alguns anos, e a estrutura educacional pouco mudou, acompanho a passagem das décadas vendo as minhas filhas dentro desse sistema, e apesar de hoje vivermos em uma democracia, pouco mudou, ainda está dentro de muros, na frente de um professor que tudo sabe, sentados em cadeiras duras, como livros em branco a serem preenchidos, com conhecimentos que muitas vezes não servirão para absolutamente nada.
            Hoje, novamente na universidade, mesmo estando na mais conceituada do país, ainda vivemos dentro de muros, sentados nas mesmas cadeiras e sendo tratados como livros em branco, abaixo da batuta de professores doutores que tudo sabem para nos preencherem com suas verdades.
            Mesmo fazendo o curso de Educação Física e Saúde, tive a oportunidade de fazer matérias de outros cursos, e escolhi fazer a matéria Cidade Constitucional e a Capital da Republica onde tive a sorte de conhecer o Prof. Nerling. Como a experiência de viver essa matéria, passando uma semana em Brasília e conhecendo um pouquinho mais como funciona o governo federal, resolvi completar os estudos fazendo a matéria de Direito Constitucional com o mesmo professor.

            Logo no primeiro dia quando o profº veio com a pergunta, vocês tem vontade de constituição¿ Fiquei olhando os alunos de Gestão de Políticas Públicas e vi olhos de muitas dúvidas e um pouco de: o que quer esse professor¿ Será difícil conseguir os créditos nessa matéria¿
            Pois é, infelizmente a educação não seguiu as transformações no mundo, não modernizou, não se tornou uma atividade atrativa a juventude, e sim uma obrigação para poder entrar no mercado de trabalho e ganhar o seu espaço, e de preferência muito dinheiro, e para isso o carimbo USP parece ser um bom passaporte.
Apesar de sempre estarem sendo provocados pelo profº a questionar a forma de ensino e para usarem a constituição como um trunfo na vida profissional de gestor, de ter consciência dos avanços que a carta magna trouxe no processo de redemocratização do país, percebi que a educação básica pouco os provocou a sair do estado de livros em branco, e a passar a serem protagonistas em transformações. Òbvio que com exceções, pois ali também tem aqueles que já vieram com viés mais questionadores e que já estavam em algum front de luta do movimento estudantil.
            Ainda hoje, com tantos ataques a direitos e a Constituição, não vemos a população se levantar contra. Estamos vendo o desmonte da Previdência Social, que é garantida na constituição, já no início nos direitos sociais (cap. II) e depois na sessão III do título VIII. Mas na escola aprendemos a conhecer e nos apropriar da Constituição¿ Será que os governos fariam ataques como esses se os cidadãos aprendessem a ter vontade de Constituição¿

            Mas como mudar esse quadro¿ Será que um dia vamos conseguir colocar em prática uma educação mais no estilo de Paulo Freire, onde o que se vem de fora dos muros é tão importante como o que estão nos livros didáticos¿ Onde as crianças e jovens possam entender e se apropriar da Constituição e cobrar que ela realmente saia do papel e que venha para a vida das pessoas no dia a dia¿ Será real a possibilidade disso acontecer, sendo que para aqueles que se mantem no poder realmente não querem pessoas questionadoras e apropriadas da constituição¿

            Estamos vivendo um momento muito delicado da política nacional, e infelizmente vimos que a população em geral ainda não sabe questionar, ainda é massa de manobra daqueles que detém o poder e dinheiro, e que decidem qual a política deve ser aplicada de acordo com os seus interesses pessoais.
            Espero realmente que aqueles que passaram por essa matéria obrigatória para os alunos de GPP, e para aqueles que tenham o interesse de ler esse texto, tenha pelo menos tocado suas mentes, e que na hora de entrarem no mercado e pensarem em políticas, principalmente na área da educação, passem para a frente a importância da vontade de constituição, da vontade de transformar a sociedade, para que  essa seja mais justa. Como espero que essa pequena contribuição alcance algumas pessoas, e as façam responder positivamente a pergunta: E vc tem vontade de Constituição¿


Gilceli Leite Lima - Graduanda Educação Física e Saúde - EACH - USP